Thursday, April 23, 2009

É feio rasgar um "Contrato Psicológico"

Há alguns anos, na empresa onde então trabalhava, tive a sorte de colaborar com um Administrador Delegado possuidor de uma visão moderna de gestão e, determinado a virar do avesso um estilo de gestão que mantinha os abúlicos trabalhadores em tarefas repetitivas Então encetámos toda uma série de projectos que visavam o envolvimento dos colaboradores: formação comportamental, políticas agressivas de comunicação, iniciativas de projecto de empresa, estabelecimentos dos valores organizacionais, políticas de reconhecimento e recompensa originais, descentralização da decisão e empowerment, sistemas de sugestões, etc. etc.
Vivia-se o entusiasmo de descobrir um novo estilo de empresa. Falávamos da gestão pela cultura, onde não era necessário dar ordens. Dizíamos que na nova empresa não era dos braços dos trabalhadores que precisávamos, mas da cabeça deles. E também do seu coração e alma!

Num curso em França, falei com entusiasmo ao professor Roland Reitter (1) e contei-lhe todos os nossos projectos. Mas em vez de me felicitar por todas estas iniciativas, ele advertiu-me com ar grave: “Tenha cuidado, porque pode estar a preparar uma grande maldade às pessoas” Protestei firmemente: Como podemos nós estar a preparar uma grande maldade se lhes estamos a dar novas perspectivas? Se lhes estamos na realidade a melhorar as suas competências, a desenvolver a sua criatividade, a despertar-lhes o desejo e ambição de fazer coisas diferentes daquilo que fizeram toda a vida? Se lhes estamos a melhora a sua empregabilidade? …

Respondeu-me de forma cortês que, apesar da honestidade das intenções, devíamos atender ao facto de a empresa ter accionistas que poderiam não valorizar da mesma forma os interesses dos trabalhadores e que, de acordo com a sua experiência, tinha assistido várias vezes a projectos semelhantes terem acabado de forma dramática: Num dia os gestores proclamavam “a empresa também é vossa” e no dia seguinte: “os resultados foram negativos e vamos ter que fechar toda esta divisão; lamentamos mas vamos ter que despedir 600 pessoas!”

Achei que ele exagerava, mas fiquei de sobreaviso.
E tenho vindo a constatar que muitos Directores de Recursos Humanos, sobretudo os mais jovens, entusiasmam-se com as iniciativas que tomam com o objectivo de envolver os colaboradores, sem ter em conta esta realidade: o poder da organização continuará sempre do lado do accionista!
Não quero de maneira nenhuma fazer parte do clube dos mais idosos que cultivam o cinismo, mas progressivamente tenho vindo a dar razão ao Professor Reiter: as expectativas que criamos nos colaboradores, estão gravadas num contrato informal, não escrito mas assumido, aquilo a que chamamos o “contrato psicológico”.

Há pois que saber, com bom senso, estabelecer o equilíbrio entre, por um lado, a necessidade de dar autonomia, de realizar o empowerment, de dar poder de iniciativa aos colaboradores, sem o que a empresa fica estéril por excessiva centralização na cúpula hierárquica das decisões, e, increver clausulas no contrato psicológico que não temos condições a prazo de respeitar.

Ao ser desrespeitado um contrato psicológico, o colaborador sente-se enganado, desmotivado, e os danos podem ser duradouros porque o tornam desconfiado de todas e quaisquer tentativas de aliciamento futuro.
Desrespeitam-se contratos psicológicos quando despedimos pessoas, ou desvalorizamo-las, ou quando as pomos de novo no seu lugar porque sentimos que não respeitam a nossa autoridade.
(1) - Roland Reiter é doutorado por Harvard e professor no HEC. Autor de diversos livros sobre os temas Cultura, Identidade e Poder nas organizações

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